Aprendizado Organizacional
O desempenho bem-sucedido das empresas japonesas, em meados dos anos 80, despertou a curiosidade e o interesse de muitos estudiosos e pesquisadores das áreas de administração de empresas e do comportamento humano que começaram a estudá-las e, a partir dos seus estudos, atribuíram parte desse sucesso ao entendimento da importância do conhecimento para a condução dos seus processos e resultados e, consequentemente, o seu gerenciamento.
A obra de Nonaka e Takeuchi “The Knowledge-Creating Company: How japonese companies create the dinamics of innovations“, publicada em 1995, despertou maior interesse no assunto e consolidou o termo Gestão do Conhecimento – GC, em inglês, Knowledge Management (KM).
O conhecimento passou a ser considerado o principal ativo intangível de uma empresa e a sua gestão passou a ser tema de muitos congressos, seminários, cursos, workshops, abordado em disciplinas de administração de empresas, gestão de pessoas entre outros.
Conscientes da relevância do tema, muitos gestores designaram equipes ou criaram setor específico para a gestão do conhecimento na organização. Por sua vez, os programas de qualidade, na identificação das melhores práticas adotadas pelas empresas bem-sucedidas incluíram entre os seus critérios de avaliação das empresas candidatas ao prêmio, itens pertinentes às pessoas, informações e conhecimento nas organizações. Devido a relevância desse tema, foram desenvolvidas várias soluções, ferramentas e softwares de KM, para auxiliar na gestão do conhecimento nas empresas. Atualmente há várias Comunidades de Prática – CoP tratando especificamente desse assunto nas redes sociais, como no LinkedIn.
Mas, é possível uma empresa aprender? Podemos afirmar que sim uma vez que as empresas podem ser consideradas sistemas complexos e as pessoas como partes integrantes e indispensáveis porque são elas que detêm os conhecimentos e as habilidades necessárias para executar as atribuições que lhes foram designadas a fim de que a empresa possa atender as necessidades dos clientes com a oferta de bens e/ou serviços, atingindo o propósito para o qual foi constituída.
Por mais simples e rudimentares que sejam as atividades de uma pessoa, o treinamento e a repetição fazem com que cada uma aprenda novas táticas, novas maneiras de fazer e, quanto maior a interação com os seus pares, mais aperfeiçoam os seus métodos e aprendem umas com as outras. Segundo Rodriguez (2002, p. 114), “O conhecimento humano é o mais valioso dos ativos intangíveis, pois ele promove ações desenvolvendo conexões fundamentais para a criação e a inovação”.
O grande desafio da aprendizagem organizacional constitui na aquisição do conhecimento necessário para o eficaz desempenho das atividades da organização e para a melhoria e inovação dos seus produtos, serviços e processos e a sua gestão, ou seja, o tratamento das informações e conhecimentos adquiridos, a retenção e a sua disseminação para o desenvolvimento dos colaboradores, de forma a transformar os conhecimentos tácitos, que estão internalizados na memória de algumas pessoas, em conhecimentos explícitos, que podem ser disseminados para os outros colaboradores através da sua retenção em algum meio físico ou digital e a liberação do seu acesso, de forma que possam ser aproveitados para a melhoria das atividades, processos, projetos ou, através de novas conexões, recombinados, modificados, ampliados ou servirem de inspiração para a inovação de produtos e serviços ofertados pela empresa.
O conhecimento pode ser estimulado e desenvolvido em todos os níveis da organização com a promoção de treinamentos, internos ou externo, workshops, palestras, formação de grupos ou comunidades para a discussão ou desenvolvimento de temas específicos, concessão de benefícios ou liberação de colaboradores para participarem de congressos, seminários, cursos de graduação, pós-graduação, mestrado, benchmarking com outras organizações para identificarem as melhores práticas, com o compromisso de, posteriormente, repassarem e registrarem o conhecimento adquirido, como palestras, discussão em grupo, geração de apresentações ou documentação, tornando-o disponível para todos os públicos internos interessados.
Segundo artigo publicado na Sociedade Brasileira de Gestão do Conhecimento – SBGC (2022, p. 530), “Dentro de uma empresa, o processo de aprendizagem é coletivo, ou pelo menos deveria ser. A companhia usa a gestão do conhecimento quando consegue mostrar e desenvolver a aprendizagem empresarial. O ambiente deve permitir o progresso de todos, além de fomentar pesquisa, análise e inovação, sempre tendo as melhorias como foco. Quando todos são motivados a trabalhar em grupo, agregam valor ao serviço e a gestão do conhecimento é mais satisfatória. Fica mais fácil identificar e corrigir erros que trazem possibilidades de melhoria, aprimorando os conhecimentos de todos”.
A aquisição de conhecimento pode ser obtida de forma assertiva e eficaz com a criação de uma cultura de aprendizado que pode envolver as equipes com a definição dos OKRs – Objetives and Key Results, ou seja, Objetivos e Resultados-Chave, metodologia introduzida por Andy Grove, ex-CEO da Intel, ou seja a definição dos objetivos que precisam atingir e o desdobramento de cada objetivo em entregáveis ou resultados-chave a serem entregues ou concluídos em prazos intermediários e que possam ser medidos (percentual, prazo, quantidade, valor atingido, etc.) para comprovar que o objetivo está sendo atingido. Para maior eficácia, visa o acompanhamento sistemático através de reuniões rápidas, em torno de 10 a 15 minutos, conforme proposto na metodologia dos métodos ágeis, inicialmente voltada para o desenvolvimento de sistemas e, devido aos resultados bem-sucedidos com a sua aplicação, estendida para outras atividades e projetos.
O acompanhamento dos resultados objetiva incentivar o desempenho da equipe e desafiá-la a encontrar soluções para atingir os resultados que estiverem aquém do esperado, sem críticas aos executores, promovendo a cultura de aprendizado.
Segundo Mello (2016-2018) “É muito importante que a organização promova a cultura de aprendizagem em torno das metas, de modo que ninguém tenha medo de trazer ‘más notícias’ em prol de ter todos os membros da equipe usando a sua massa cinzenta para resolver problemas e achar soluções”.
O ideal é a utilização de um sistema disponível no mercado, ou desenvolvido pela empresa, que disponha de um painel para o acompanhamento da equipe e que as informações estejam disponíveis para todos em repositórios ou intranet da empresa, se for o caso e, no final do ciclo, possibilite às lideranças avaliarem, junto às suas equipes, os resultados atingidos e o aprendizado adquirido para a melhoria das atividades e processos envolvidos.
Os principais benefícios da aprendizagem organizacional estão ligados a sustentabilidade da organização, envolvendo a sua capacidade de adaptar-se às exigências do mundo VUCA, ou seja, com a sua volatilidade (Volatility), incertezas (Uncertainly), complexidade (Complexity) e ambiguidades (Ambiguity), onde as mudanças ocorrem de forma exponencial e a aprendizagem organizacional torna-se uma exigência.
Segundo o artigo de publicado no site da Fundação Nacional da Qualidade – FNQ, a sustentabilidade da organização depende da geração de resultados para todos os integrantes da cadeia de valor, o que, para a sua eficácia, requer o entendimento e o envolvimento de todos os colaboradores da organização.
O nosso conceito de excelência serve para a reflexão que queremos trazer a este respeito: entendemos excelência como sendo a compreensão de que a organização é um sistema vivo, integrante de um ecossistema complexo com o qual interage e do qual depende. Que é preciso gerar resultado para todos os integrantes da cadeia de valor, em uma relação de interdependência e cooperação. Essa é a garantia de sustentabilidade e perenidade para a organização (Bardagi, 2017).
Ainda, segundo o autor do artigo publicado no site da Fundação Nacional da Qualidade – FNQ, relacionando o aprendizado à inovação, bem a diversidade de pensamentos, necessária para estimular a criatividade e a inovação, requisitos cada vez mais imprescindíveis para garantir a sustentabilidade das organizações.
Não pode haver melhoria sem aprendizado e inovação e assim é que entendemos esta dinâmica. Por isso, a relevância de dominarmos os processos de aprendizagem organizacional. Organizações altamente adaptáveis são aquelas cuja cultura é porosa, onde cabe a diversidade de pensamento, onde ideias são compartilhadas, onde a ação coletiva é impulsionada (Bardagi, 2017).
Todos os colaboradores precisam estar preparados para enfrentar esse mundo VUCA e, as suas competências e habilidades são fundamentais nesse processo.
Quando nos confrontamos com um sistema imenso, nossa atenção precisa ser amplamente distribuída. Há um limite no que um par de olhos pode ver. Uma porção deles capta muito mais. Uma entidade mais robusta capta as informações mais relevantes, as compreende mais profundamente e responde com maior agilidade. Nós, coletivamente, podemos nos tornar essa realidade (Goleman, 2014, p. 152).
A partir dos estudos adquiridos e da minha experiência prática tratando desses temas no desenvolvimento dos serviços de Consultora Organizacional e Comportamental há mais de duas décadas, observo que a segurança psicológica dos colaboradores para proporem as suas ideias, experimentarem, errarem e acertarem, além do aprendizado organizacional decorrente das suas iniciativas, incentivos recebidos e interações com os seus pares e outras equipes envolvidas, são fundamentais para o êxito das suas atividades e geração de ambiente propício para a criatividade e inovação dos processos, produtos e serviços, requisitos essenciais para garantir a sustentabilidade e o sucesso das organizações.
Referência Bibliográficas:
Bargadi, M. (2017). MEG 21: modelos de referencia para um cenário de mudanças exponenciais. Acessado em 10/02/2022. Disponível em: https://adm.fnq.org.br/informe-se/artigos-e-entrevistas/artigos/meg-21-modelo-de-referencia-para-um-cenario-de-mudancas-exponenciais
Goleman, D. (2014) Foco: A atenção e o seu papel fundamental para o sucesso. Rio de Janeiro: Objetiva.
Mello, F. S. H. (2016 – 2018) OKRs – da Missão às Métricas: usando as OKRs para criar uma cultura de execução e inovação na sua empresa. E-book Amazon: Qulture Rocks.
Rodriguez, M. V. R. (2002) Gestão Empresarial: Organizações que aprendem. Rio de Janeiro: Qualitymark.
Sociedade Brasileira de Gestão do Conhecimento – SBGC (2022) Descubra os princípios da gestão do conhecimento. Acessado em 10/02/2022, disponível no site, em: http://www.sbgc.org.br/blog/descubra-os-principios-da-gestao-do-conhecimento
Lúcia Arlete Machado Nunes
Consultora Organizacional e Comportamental, CEO da DRAGON Consultoria Organizacional Ltda. Administradora de Empresas, mestre em Psicologia Organizacional, Coach e Consteladora Sistêmica